Tsunamis: a calma antes da onda
Onde e quando vai ocorrer o próximo tsunami?
por Tim Folger
Fonte: NATIONAL GEOGRAPHIC BRASIL ONLINE
Uma falha sob o estreito Puget pode provocar um terremoto
devastador em Seattle (vista aqui de um barco navegando sobre a falha).
Um tsunami atingiria a cidade americana em menos de dez minutos.
Jin Sato é o prefeito de uma cidadezinha que não existe mais.
Minamisanriku, uma vila de pescadores ao norte de Sendai, no nordeste do
Japão, desapareceu em 11 de março de 2011. Por muito pouco Sato não
sumiu junto. O desastre começou às 14h46, a 130 quilômetros dali, em
pleno Pacífico, ao longo de uma profunda falha geológica sob o leito do
oceano. Com 450 quilômetros de extensão, um bloco da crosta terrestre
deslocou-se para leste – em alguns pontos moveu-se quase 24 metros. Sato
acabara de finalizar uma reunião na prefeitura. Dois dias antes, a
região fora sacudida por um tremor – um sismo precursor, hoje sabem os
cientistas, do terremoto de 11 de março, que seria o de maior magnitude
da história do Japão.
Quando a terra afinal parou de tremer, após cinco minutos
desesperadores, a vila de Minamisanriku estava quase toda intacta. Mas o
mar havia começado a se mexer. Sato e dezenas de outros correram até um
prédio de três andares ao lado, onde estava instalado o centro de
defesa civil. A jovem Miki Endo, de 24 anos, trabalhava no segundo
andar, e passou a transmitir um alerta pelos alto-falantes da vila: “Por
favor, corram para os terrenos mais altos!” Sato e a maioria de seu
grupo buscaram refúgio no telhado. De lá puderam observar o tsunami
ultrapassar a muralha de concreto, com 5,5 metros de altura, erguida no
mar para proteger o vilarejo. Eles ouviram a vaga gigantesca esmigalhar
tudo o que encontrava pela frente. Casas de madeira foram destroçadas;
vigas de aço gemeram estridentes. Em seguida, a onda de água
cinza-
escuro alcançou o topo do edifício em que estavam. De repente
cessaram os alertas transmitidos por Miki Endo.
O tsunami destruiu diversas cidadezinhas no litoral da região de
Tohoku, e deixou desabrigadas centenas de milhares de pessoas. Em
Minamisanriku, contam-se mais de 900 mortos nos 17,7 mil habitantes
(entre eles Miki Endo, cujo corpo foi achado em 23 de abril). Sato só
conseguiu sobreviver porque se agarrou em uma antena de rádio no
telhado. “Acho que fiquei submerso por três ou quatro minutos”, conta.
Muitas das 30 e tantas pessoas que lá estavam tentaram se segurar na
balaustrada de ferro que rodeava o topo. As ondas continuaram a fustigar
por toda a noite, e nas primeiras horas inundaram repetidas vezes o
prédio de três andares. Quando amanheceu, apenas dez pessoas restavam no
telhado.
O Japão está na vanguarda mundial em termos de medidas de precaução
contra terremotos e ondas gigantes. Bilhões de dólares foram gastos no
país para reforçar a estrutura de edifícios antigos e instalar sistemas
de absorção de choque nos prédios novos. Altas barreiras de concreto
foram erguidas para proteger muitas cidades costeiras, nas quais foram
demarcadas rotas de evacuação para terrenos elevados ou edifícios mais
resistentes. Em 11 de março, os sismólogos do governo mal haviam deixado
de abraçar seus monitores para que não se espatifassem no chão quando
soou o primeiro alerta de tsunami.
Esse conjunto de medidas salvou milhares de vidas. O terremoto que
sacudiu Tohoku, de grau 9, provocou bem menos danos do que o faria em
outros países. No entanto, entre 16 mil e 20 mil moradores morreram em
Tohoku por causa do tsunami – uma quantia de vítimas fatais comparável
àquela causada por outro terremoto acompanhado de tsunami na mesma
região em 1896.
Desde o fim do século 19, as defesas do Japão foram melhoradas, mas
nesse período também triplicou a população do país. Hoje seu litoral tem
uma densidade demográfica bem maior. O mesmo vale para o resto do
planeta, em países que estão bem menos preparados. Na área do oceano
Índico em que o tsunami mais mortífero da história fez quase 230 mil
vítimas fatais, em 2004, a maioria delas da Indonésia, já se prevê a
ocorrência de outro desastre similar em algum momento nos próximos 30
anos. Nos Estados Unidos, cuja costa noroeste foi assolada por uma
grande onda há 300 anos, quando a região era esparsamente povoada,
também é inevitável que aconteça outro, segundo os geólogos.
O próprio Jin Sato era um sobrevivente de outro tsunami de grandes
proporções. Em 1960, quando tinha 8 anos, uma onda de 4 metros provocou a
morte de 41 pessoas em Minamisanriku. Depois disso é que foi tomada a
decisão de erguer no mar uma barreira de proteção. “Achamos que
estávamos seguros”, diz Sato. “Segundo os sismólogos, o tsunami poderia
chegar a 5,5 ou 6 metros. Mas esse tinha o triplo dessa altura.”
Quase todo ano, os tsunamis atingem alguma região do mundo e, na
opinião de determinados estudiosos, aqueles de proporções gigantescas
chegam até a mudar o curso da história. De acordo com alguns
arqueólogos, um tsunami no mar Mediterrâneo devastou o litoral de Creta
há mais de 3,5 mil anos.
O desastre abalou a civilização minoica, uma
das mais avançadas da época, e fez com que fosse suplantada pelos gregos
micênicos. Em 1755, quando um terremoto com tsunami matou dezenas de
milhares em Lisboa, a tragédia teve um impacto duradouro no pensamento
ocidental, contribuindo para demolir o otimismo complacente então
vigente. No romance Cândido, de Voltaire, o ingênuo filósofo Pangloss,
ao visitar Lisboa logo após a catástrofe, insiste em dizer que “tudo vai
pelo melhor neste que é o melhor de todos os mundos possíveis”, e acaba
sendo enforcado por seu otimismo. A sátira fulminante de Voltaire
tornou um pouco mais difícil de se adotar a posição de seu personagem
filósofo – ou seja, a de acreditar que um Deus benevolente havia criado o
melhor dos mundos.
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