terça-feira, 28 de outubro de 2014

Tsunamis: a calma antes da onda

Onde e quando vai ocorrer o próximo tsunami?

por Tim Folger Fonte: NATIONAL GEOGRAPHIC BRASIL ONLINE
Jin Sato é o prefeito de uma cidadezinha que não existe mais. Minamisanriku, uma vila de pescadores ao norte de Sendai, no nordeste do Japão, desapareceu em 11 de março de 2011. Por muito pouco Sato não sumiu junto. O desastre começou às 14h46, a 130 quilômetros dali, em pleno Pacífico, ao longo de uma profunda falha geológica sob o leito do oceano. Com 450 quilômetros de extensão, um bloco da crosta terrestre deslocou-se para leste – em alguns pontos moveu-se quase 24 metros. Sato acabara de finalizar uma reunião na prefeitura. Dois dias antes, a região fora sacudida por um tremor – um sismo precursor, hoje sabem os cientistas, do terremoto de 11 de março, que seria o de maior magnitude da história do Japão.
Quando a terra afinal parou de tremer, após cinco minutos desesperadores, a vila de Minamisanriku estava quase toda intacta. Mas o mar havia começado a se mexer. Sato e dezenas de outros correram até um prédio de três andares ao lado, onde estava instalado o centro de defesa civil. A jovem Miki Endo, de 24 anos, trabalhava no segundo andar, e passou a transmitir um alerta pelos alto-falantes da vila: “Por favor, corram para os terrenos mais altos!” Sato e a maioria de seu grupo buscaram refúgio no telhado. De lá puderam observar o tsunami ultrapassar a muralha de concreto, com 5,5 metros de altura, erguida no mar para proteger o vilarejo. Eles ouviram a vaga gigantesca esmigalhar tudo o que encontrava pela frente. Casas de madeira foram destroçadas; vigas de aço gemeram estridentes. Em seguida, a onda de água cinza-
escuro alcançou o topo do edifício em que estavam. De repente cessaram os alertas transmitidos por Miki Endo.
O tsunami destruiu diversas cidadezinhas no litoral da região de Tohoku, e deixou desabrigadas centenas de milhares de pessoas. Em Minamisanriku, contam-se mais de 900 mortos nos 17,7 mil habitantes (entre eles Miki Endo, cujo corpo foi achado em 23 de abril). Sato só conseguiu sobreviver porque se agarrou em uma antena de rádio no telhado. “Acho que fiquei submerso por três ou quatro minutos”, conta. Muitas das 30 e tantas pessoas que lá estavam tentaram se segurar na balaustrada de ferro que rodeava o topo. As ondas continuaram a fustigar por toda a noite, e nas primeiras horas inundaram repetidas vezes o prédio de três andares. Quando amanheceu, apenas dez pessoas restavam no telhado.
O Japão está na vanguarda mundial em termos de medidas de precaução contra terremotos e ondas gigantes. Bilhões de dólares foram gastos no país para reforçar a estrutura de edifícios antigos e instalar sistemas de absorção de choque nos prédios novos. Altas barreiras de concreto foram erguidas para proteger muitas cidades costeiras, nas quais foram demarcadas rotas de evacuação para terrenos elevados ou edifícios mais resistentes. Em 11 de março, os sismólogos do governo mal haviam deixado de abraçar seus monitores para que não se espatifassem no chão quando soou o primeiro alerta de tsunami.
Esse conjunto de medidas salvou milhares de vidas. O terremoto que sacudiu Tohoku, de grau 9, provocou bem menos danos do que o faria em outros países. No entanto, entre 16 mil e 20 mil moradores morreram em Tohoku por causa do tsunami – uma quantia de vítimas fatais comparável àquela causada por outro terremoto acompanhado de tsunami na mesma região em 1896.
Desde o fim do século 19, as defesas do Japão foram melhoradas, mas nesse período também triplicou a população do país. Hoje seu litoral tem uma densidade demográfica bem maior. O mesmo vale para o resto do planeta, em países que estão bem menos preparados. Na área do oceano Índico em que o tsunami mais mortífero da história fez quase 230 mil vítimas fatais, em 2004, a maioria delas da Indonésia, já se prevê a ocorrência de outro desastre similar em algum momento nos próximos 30 anos. Nos Estados Unidos, cuja costa noroeste foi assolada por uma grande onda há 300 anos, quando a região era esparsamente povoada, também é inevitável que aconteça outro, segundo os geólogos.
O próprio Jin Sato era um sobrevivente de outro tsunami de grandes proporções. Em 1960, quando tinha 8 anos, uma onda de 4 metros provocou a morte de 41 pessoas em Minamisanriku. Depois disso é que foi tomada a decisão de erguer no mar uma barreira de proteção. “Achamos que estávamos seguros”, diz Sato. “Segundo os sismólogos, o tsunami poderia chegar a 5,5 ou 6 metros. Mas esse tinha o triplo dessa altura.”
Quase todo ano, os tsunamis atingem alguma região do mundo e, na opinião de determinados estudiosos, aqueles de proporções gigantescas chegam até a mudar o curso da história. De acordo com alguns arqueólogos, um tsunami no mar Mediterrâneo devastou o litoral de Creta há mais de 3,5 mil anos. 
O desastre abalou a civilização minoica, uma das mais avançadas da época, e fez com que fosse suplantada pelos gregos micênicos. Em 1755, quando um terremoto com tsunami matou dezenas de milhares em Lisboa, a tragédia teve um impacto duradouro no pensamento ocidental, contribuindo para demolir o otimismo complacente então vigente. No romance Cândido, de Voltaire, o ingênuo filósofo Pangloss, ao visitar Lisboa logo após a catástrofe, insiste em dizer que “tudo vai pelo melhor neste que é o melhor de todos os mundos possíveis”, e acaba sendo enforcado por seu otimismo. A sátira fulminante de Voltaire tornou um pouco mais difícil de se adotar a posição de seu personagem filósofo – ou seja, a de acreditar que um Deus benevolente havia criado o melhor dos mundos.

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